ALEX SABINO
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O treinador de 38 anos sabe o momento da afirmação. Foi quando deixou de ser, para os olhos da maioria, o filho de Jairzinho, o Furacão da Copa de 1970, para ser Jair Ventura, técnico do Botafogo.
Efetivado no cargo no ano passado, ele consegue tirar o máximo de um clube de recursos financeiros limitados.
Está nas quartas de final da Libertadores. Nesta quarta (16), às 21h40, comanda o time contra o Flamengo, pelas semifinais da Copa do Brasil. Um rival que investiu muito em reforços e tem, ao lado do Palmeiras, o elenco mais caro do futebol nacional.
Em entrevista à reportagem, Ventura descarta a experiência como medidor da competência, contesta quem o vê como técnico de ascensão meteórica e sonha com um título de expressão pelo clube em que seu pai, um dos maiores atacantes da história do futebol brasileiro, fez história.
REPORTAGEM - Você levou o Botafogo às quartas da Libertadores e à semi da Copa do Brasil. Até onde esse time pode chegar?
JAIR VENTURA - Não penso para frente. Posso garantir a performance. Não posso garantir o resultado. A única coisa que é possível garantir é que a gente vai dar o máximo em campo. Tem sido assim desde que eu assumi, no ano passado. Quando você trabalha honestamente e dá o seu melhor, o melhor acontece.
R - Se o resultado não é o mais importante, como medir o sucesso do seu trabalho?
JV - Vamos continuar assim e no final do ano a gente vai ver.
R - Você vai enfrentar na semifinal o elenco mais caro do Brasil, ao lado do Palmeiras. O seu time tem futebol sólido, mas não chega perto de ser caro como o do Flamengo. Dinheiro faz diferença?
JV - Ajuda em qualquer segmento da vida. Se você vai abrir um restaurante e investir R$ 16 milhões e o meu vale R$ 3 milhões, tem tudo para o seu restaurante dar mais certo que o meu. No futebol não é diferente, só que não é uma ciência exata. Quando começa o jogo, não há discrepância salarial.
R - É uma questão de vontade?
JV - Eu sempre digo para os atletas que o rival não pode ter mais vontade que a gente. De alguma maneira, nós vamos igualar esses jogadores caríssimos que vamos enfrentar e fazer isso com uma equipe organizada, de muita entrega. É assim que conseguimos levar o Botafogo longe.
R - A impressão é que os jogadores acreditam cegamente no que você fala.
JV - Eu sou um cara simples. Falo a verdade sempre. Os maiores responsáveis são os jogadores. Eles compram a ideia e executam da melhor maneira. Não resolve nada eu ter grandes ideias se eles não acreditarem. São os jogadores quem deixam a última gota de suor em campo.
R - Por seu pai ser quem é, o título do Botafogo valeria mais do que por outros clubes?
JV - Não tem como dizer que não é importante. Tenho carinho enorme pelo Botafogo. Seria muito importante coroar esses nove anos de casa com um título. Mas não posso ser incoerente porque falei que penso jogo a jogo. Quem sabe com essa filosofia não vamos chegar ao grande momento?
R - Você é um técnico jovem. Idade pesa para comandar?
JV - Zero. Idade não pesa nada. [Ser jovem] É até facilitador por eu estar mais próximo da realidade que eles vivem hoje. A gente pensa igual.
R - Vocês pensam igual, mas o treinador não pode agir igual.
JV - Eu me preparei por 12 anos. Essa é a diferença. Meu primeiro clube foi em 2005.
R - Preparou-se como?
JV - Estudei. Foram nove anos como auxiliar-técnico, treinador do sub-20, auxiliar na seleção brasileira sub-15, sub-17 e sub-20, fiz cursos de gestão, psicologia, coaching, outros idiomas... Falo inglês e francês. Sou um cara que busco estudar e me aprimorar não só como profissional, mas como pessoa. Isso me dá chance de ajudar meus atletas. Não é porque eu tenho cabelos brancos que vão me respeitar. Eles vão comprar minhas ideias se eu for um cara sincero.
R - A impressão é a de que as pessoas te veem em um grande clube e não sabem o quanto ralou?
JV - Parece que foi rápido, né?
R - Você hoje é visto como Jair Ventura, não apenas como o filho do Jairzinho?
JV - Sim. Carrego peso grande por ser filho dele e por ter jogado futebol. Parei com 26 anos. Eu era atacante. As comparações eram inevitáveis.
R - Como técnico é mais fácil?
JV - É outra função. Eu busquei meu espaço. Saí de casa aos 16 anos. Poderia hoje ser apenas o filho do Jairzinho e cuidar de algumas situações para ele, o que já seria maravilhoso.
Agradeço a Deus todos os dias por essa bênção que Ele me deu. Mas eu fui buscar meu espaço. Primeiro como jogador e agora como treinador. Ainda estou apenas engatinhando.
R - Você disse que te incomoda a presença de técnicos estrangeiros, como Reinaldo Rueda, contratado pelo Flamengo.
JV - Problema não é o Reinaldo Rueda. O que me incomoda é ver a desconfiança que os treinadores brasileiros encontram no exterior. Não tenho nada contra técnicos estrangeiros trabalhando no Brasil.
Deixe seu comentário sobre: "'Não é porque tenho cabelos brancos que vão me respeitar', diz Jair Ventura"