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'Mãe, a Chape morreu?', pergunta filho de 4 anos à mãe, em Chapecó

JULIANA GRAGNANI, ENVIADA ESPECIAL CHAPECÓ, SC, (FOLHAPRESS) - A cidade pacata foi tomada por uma onda verde, mas com o verde veio o preto, de luto. O simples "oi, tudo bem?" perdeu sua função fática: não, não está tudo bem, dizem os moradores de Chapecó,

Da Redação

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Escrito por Da Redação
Publicado em 30.11.2016, 19:35:10 Editado em 30.11.2016, 19:40:11
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JULIANA GRAGNANI, ENVIADA ESPECIAL

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CHAPECÓ, SC, (FOLHAPRESS) - A cidade pacata foi tomada por uma onda verde, mas com o verde veio o preto, de luto. O simples "oi, tudo bem?" perdeu sua função fática: não, não está tudo bem, dizem os moradores de Chapecó, 210 mil habitantes encravados no oeste catarinense.

Um dia após a tragédia que matou quase o time inteiro da Chapecoense e jornalistas locais, deixando 71 mortos após a queda de um avião na Colômbia, habitantes de Chapecó se vestiram com a camisa do time e penduraram símbolos de luto em suas casas e comércios.

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No carro de bombeiros, um detalhe: faixas pretas nos retrovisores. Em um hotel, atendentes confeccionam pequenos broches pretos e verdes para colocar na lapela. Manequins não são mais visíveis nas vitrines, cobertas por largas faixas de luto. Quem não está com a camisa do time dá um jeito de usar algo verde.

"Meu filho de quatro anos me perguntou: 'mãe, a Chape morreu?'. Eu não falei nada para ele, mas ele está vendo tudo que está acontecendo", lamenta a professora Cristiane Moreira, 37, vestindo a camisa do time, carregando Leonardo, também usando a sua.

Cristiane e o filho aguardavam a chegada de parentes no aeroporto de Chapecó na tarde desta quarta (30). Ao falar sobre a tragédia, ela começou a chorar, cobrindo os olhos com óculos escuros.

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Se parte da cidade está silenciosa, a região no entorno da Arena Condá, na zona leste, é só ruído. Sob forte sol, um trânsito atípico surge ali, onde torcedores se reúnem, sem saber o que fazer. Penduram homenagens nas grades, passam horas apenas observando o gramado e choram.

Profissionais da imprensa do mundo inteiro também lotam o local. No vestiário, familiares dos jogadores mortos no acidente recebem atenção de profissionais da saúde.

"Eles eram os filhos amados. De repente, por causa deles, Chapecó apareceu no cenário. O time deu notoriedade à cidade. Chapecó começou a existir a partir do futebol, que é o coração do brasileiro", diz Maria Helena Franco, professora titular da PUC-PR e coordenadora do laboratório de luto da universidade. "As pessoas ficam desorientadas, têm uma experiência sofrida. E as crianças vão viver talvez sua primeira perda importante. É essencial que esse sofrimento seja validado, reconhecido."

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"A gente fica sem chão", diz o estudante Ezequías Weber, aparentando ser mais maduro do que uma criança de sua idade: 14. "Meus pais me acordaram, ligamos a TV e ficamos assistindo. Depois, na escola, não tivemos aulas. Ficamos orando para que encontrassem mais sobreviventes." Usando a camiseta do time, planejava comparecer à vigília coletiva na noite desta quarta (30), no estádio, às 20h.

"Essa daí nem queria ver TV", diz o aposentado Jodelcir Pereira, 64, apontando para a neta, Larissa, de 11 anos. Ela ouve o avô e responde: "É que a Chapecoense sempre esteve lutando e agora... isso". E cita os jogadores favoritos: Bruno Rangel e Danilo. Ao lado, a irmã de um ano e seis meses, Mirella, brincava com velas em cima de uma caixa de areia, homenagem para os jogadores improvisada no estádio.

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Presidente em exercício da Chapecoense, Ivan Tozzo diz ficar pensando nas crianças que perderam seus pais no acidente. "É difícil pra caramba", lamenta. "Os jogadores de futebol são jovens e todos eles têm crianças de 3, 4, 5 anos... e criança mexe com a gente."

Foi na escolinha da Chapecoense que o jogador de futebol João Antonio Appi, 18, que nasceu e cresceu em Chapecó, começou a praticar o esporte. De repente, perdeu os ídolos. Estava em Mogi Mirim (SP), onde joga nas categorias sub-18 e sub-20, quando soube da notícia.

"Torço para a Chapecoense desde que nasci", diz o jogador, que conhecia o goleiro Danilo e o fotógrafo Gilberto Pace Thomaz, o Giba, mortos no acidente. Para ele, porém, a tragédia pode ser uma oportunidade para os jovens jogadores do time ajudarem a reerguê-lo. "Seria honroso", diz o jovem, cujos planos para assistir ao jogo com amigos em Curitiba foram cancelados; agora, também vai à vigília.

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De manhã, no aeroporto de Viracopos, em Campinas (100 km de São Paulo), passageiros esperavam o voo para Chapecó com um assunto em comum: o acidente. Todos pareciam ter um amigo ou conhecido que estava no voo.

Usando a camisa do time, o comerciante Preto Zanella, 43, conta como recebeu uma ligação de seu pai de madrugada: seu amigo Nilson Folle Júnior, membro da diretoria com quem viajou para Florianópolis no ano passado, e outros conhecidos, como Edir Félix de Marco, ex-presidente do clube, e o presidente Sandro Luiz Pallaoro, haviam morrido. Saiu do Mato Grosso, onde estava a trabalho, para voltar para a região oeste de Santa Catarina, onde imaginava haver "só tristeza".

"Agora é tentar confortar todo mundo porque a vida não para", diz ele, que assistiu ao último jogo do time na Arena Condá.

Com olhos marejados, o engenheiro mecânico Felipe Crestani, 34, falava sobre a expectativa de reencontrar sua cidade, agora em luto. "Para onde íamos, encontrávamos um jogador. A relação da cidade com o time é muito estreita", afirma.

A trabalho em Joinville (SP), Crestani recebeu ligações pela manhã de terça (29) sobre o acidente, que vitimou seu amigo de infância Nilson Folle Júnior, membro da diretoria do clube.

"O time não é só a cidade, é toda a região", avalia o projetista Wilson Voss, 59, de Joaçaba, a 110 km de Chapecó. "Todos estávamos torcendo muito. A forma como amavam a camisa e o profissionalismo fizeram com que chegassem onde chegaram."

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