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Imigrantes vivem batalha diária em busca da inclusão

Sancionada no mês passado, a nova Lei da Migração é considerada um avanço ao que tange os direitos humanos. Com a medida em vigor, os imigrantes passaram a ter direitos e liberdades civis, culturais e econômicas, além de acesso a serviços públicos de saúd

Da Redação

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Jean Claude Cadet, de 27 anos, que está há três anos em Arapongas. Foto: Delair Garcia
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Jean Claude Cadet, de 27 anos, que está há três anos em Arapongas. Foto: Delair Garcia
Escrito por Da Redação
Publicado em 26.06.2017, 09:21:00 Editado em 26.06.2017, 14:07:52
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Sancionada no mês passado, a nova Lei da Migração é considerada um avanço ao que tange os direitos humanos. Com a medida em vigor, os imigrantes passaram a ter direitos e liberdades civis, culturais e econômicas, além de acesso a serviços públicos de saúde, assistência e Previdência Social, à justiça e à educação pública. Entre as principais mudanças destacam-se ainda a desburocratização do processo de regularização migratória e a institucionalização da política de vistos humanitários. Para os cerca de 300 imigrantes – estimativa baseada em informações da próprias comunidades e instituições humanitárias - que vivem na região, a expectativa é que a nova lei torne a adaptação ao país mais fácil. 

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Atualmente, no Brasil, os vistos humanitários são provisórios e concedidos apenas a sírios e haitianos. Com a nova lei, fica permitido que pessoas em situação de risco possam chegar ao Brasil de maneira segura. E, quando chegarem, solicitarem refúgio ou outra forma de proteção humanitária internacional.Para a coordenadora regional da Cáritas, Márcia Ponce, de Curitiba, a nova Lei da Migração é um grande avanço, apesar da lei ter sofrido mais de 20 vetos pelo presidente Michel Temer. “Mesmo assim, é considerada como um avanço, pois toma um viés mais humanitário na perspectiva dos direitos humanos, diferente do Estatuto do Estrangeiro, que era do período da ditadura que previa especialmente a segurança nacional vendo o imigrante como um invasor”, argumenta.

Na avaliação de Márcia, a nova lei traz aspectos humanitários, mas não traz grandes novidades pois muitas questões já estão garantidas na Constituição Federal. “Mesmo assim consideramos que demos grandes passos, pois a lei também foi construída com grande participação das organizações da sociedade civil que defendem essa temática”, pontua.Porém, no dia a dia, a situação dos imigrantes é um desafio tanto para quem chega quanto para organizações da sociedade civil. 

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“Nós temos a lei que pode promover a entrada no país, mas temos grandes limitações nas políticas públicas que promovam de fato essa inclusão. Em um primeiro momento, as maiores dificuldades vivenciadas pelos imigrantes é a questão do idioma, depois o trabalho, a moradia e integração na comunidade”, elenca.O abrigamento, segundo ela, é o maior desafio vivenciado tanto pelas organizações da sociedade civil, quanto pelos imigrantes. “Não temos nenhuma casa de acolhida para imigrantes no nosso Estado. O Paraná assinou uma carta aceite para esse serviço regionalizado de acolhimento institucional para imigrantes, mas como tem a contrapartida do governo do estado, esse serviço ainda não foi implementado”, observa. 

Números
A realidade de migração no estado do Paraná é bem diversa. “Não dá para precisar exatamente o número de migrantes e refugiados que estão no Estado. Fala-se em torno de 2 mil imigrantes na região de Londrina, de 2 mil a 3 mil na região de Maringá, em Umuarama, Cascavel e sabemos que em Apucarana e Arapongas, há um grande número de haitianos que não sabemos precisar de fato. O fenômeno das migrações é sempre muito dinâmico, portanto, é mais difícil de se trabalhar com número atualizados”, diz.

Em busca de trabalho Aos 42 anos, o haitiano Jean Edmond Anaxil, que está há cinco meses em Apucarana, luta diariamente para manter a esperança numa vida melhor. Ele, que veio para o Brasil há dois anos em busca do sonho de trabalhar e ganhar o suficiente para conseguir enviar parte da renda para a família, mostra decepcionado a carteira de trabalho em branco. Sem conseguir emprego há um ano, Jean sobrevive da solidariedade de amigos, que fez neste tempo, e de pessoas ligadas à igreja que frequenta. A situação de Jean retrata a de centenas de outros imigrantes que tiveram os planos prejudicados pela retração econômica e falta de estrutura social do país. Sem renda fixa, Jean não consegue entrar em contato com a família regularmente que deixou em Cabaret, no Haiti. 

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“A última vez que consegui falar com eles foi em novembro. É muito triste, porque estou longe da minha família. Não consigo mandar dinheiro para pagar a escola nem dar afeto”, lamenta.Os três filhos, sendo dois meninos de 13 e 16 anos, e uma menina, de 9, vivem com a mãe de Jean, que tem 65 anos. A esposa dele, Simone Vicent, de 44 anos, está trabalhando em Curitiba como diarista. “Estava com ela em Curitiba, mas fiquei sem emprego um ano, por isso, resolvi vir para Apucarana. Ela veio, mas voltou porque não conseguia trabalho aqui”, conta.Hoje, ele vive sozinho numa casa de fundo e sobrevive de “bicos”, que não são o suficiente para pagar o aluguel de R$350 por mês. “Sou pedreiro e também sei fazer solda”, diz.Há dois meses ficou ainda mais difícil. “Entraram na minha casa e levaram o meu celular”, relata, o que o deixa sem um meio e comunicação com as empresas e com a família. Ainda assim, ele tem esperança e quer continuar em Apucarana. “Não quero voltar para Curitiba. Lá está muito racista. Aqui é melhor”, diz.

Migrar é um direito humano
Todo ser humano tem o direito de migrar em buscar de uma vida melhor. Direito que consta na Declaração Universal dos Direitos Humanos. Dirceu Pereira da Silva, secretário e assessor da da Cáritas de Apucarana, observa, no entanto, que as maiores movimentações são decorrentes de dificuldades econômicas, como a que tem abatido atualmente a Venezuela, perseguições religiosas e políticas, guerras e catástrofes naturais, como a que ocorreu no Haiti, em 2010, provocando a saída de milhares de haitianos em busca de emprego pelo mundo. Na região, Dirceu observa que a acolhida é feita basicamente via Centro de referência de Assistência Social (Cras), mas, de modo geral, faltam políticas públicas que promovam a inserção na sociedade, em especial ao mercado de trabalho. “A vida dos imigrantes haitianos é difícil. Geralmente, moram em casas menores, nos fundos de outras residências. Eles precisam fazer sobrar um pouco do salário que ganha para mandar para a família que fica no país de origem”, diz.Na avaliação de Dirceu, o povo brasileiro, em geral, é bastante acolhedor, porém, alguns ainda têm preconceito quanto a cor da pele. 

Cerca de 70% dos haitianos deixaram Arapongas
A inserção no mercado de trabalho é um dos principais desafios de quem chega ao Brasil. Segundo dados da Coordenação Geral de Imigração (CGIg), no primeiro trimestre de 2017, foram emitidas 7.989 carteiras de Trabalho e Previdência Social a estrangeiros. Desse total, 3.017 foram para haitianos. Em Arapongas, que tem uma das maiores comunidades de haitianos da região, o número de imigrantes também tem reduzido drasticamente. A Associação dos Haitianos de Arapongas do Estado do Paraná está praticamente desativada. Quem continua na cidade estima que cerca de 300 haitianos permanecem trabalhando nas empresas locais. Um deles é Jean Claude Cadet, de 27 anos, que está há três anos em Arapongas. Trabalhando como garçom em uma churrascaria, ele não pensa em deixar a cidade. “A vida é boa aqui. Não penso em ir embora. Todos os lugares têm o lado bom e ruim. É um país sossegado e as pessoas muito simpáticas, mas o salário não é tão bom quando convertido em dólar, o que dificulta o envio de dinheiro para a família no Haiti ”, diz. Jean Claude comenta ainda que as dificuldades sociais afastaram os outros imigrantes. 

“A maioria foi embora para os Estados Unidos e Chile”, diz. Ele, que casou com uma brasileira, não pensar em deixar o Brasil nem voltar para o Haiti. “Quero aprender português melhor e entrar futuramente numa faculdade de engenharia civil (curso que fazia antes de vir para o Brasil)”, diz. Falar português também é um desafio para André Michelet Altidor, de 29 anos, que é colega de trabalho de Jean Claude e conterrâneo. André também chegou há cerca de três anos e deste então trabalha na mesma churrascaria, que conta com outro haitiano e uma venezuelana, que é a esposa de André. “Eu estou feliz aqui. Já financiei a minha casa com minha esposa. Temos uma filha, que nasceu aqui. Quero futuramente me naturalizar brasileiro e aprender falar melhor português”, diz.

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